quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Peça muito interessante com o Rei

"Em 1960, um menino aterrou em Lisboa para mudar o futebol português. 50 anos depois, continua o mesmo: humilde

Eusébio é um prato. E não dizemos isto só porque o entrevistámos na Tia Matilde, durante a hora (adiantada) de almoço. É a pura convicção do i. Eusébio é um prato, expressão que indicia divertimento e afabilidade. Vamos por partes: o i quer entrevistá-lo a propósito da sua chegada a Portugal, fez 50 anos no dia 15, e telefona-lhe. Assim, sem passar por ninguém. Do outro lado atende Eusébio, como um comum mortal. E toda a gente sabe que Eusébio não é um qualquer. É O Eusébio, com "o" maiúsculo. O Eusébio que ainda hoje suscita admiração e é reconhecido em qualquer parte do mundo, seja na Bósnia, na Venezuela ou no Vietname.

O Eusébio que foi eleito pela FIFA como o nono melhor jogador de todos os tempos no século XX. À sua frente, Pelé (que pede uma batelada de dólares por cada entrevista), Cruijff (é difícil falar com alguém que divide os seus dias entre o golfe e o... golfe), Beckenbauer (Munique é já ali, mas o Kaiser "só com marcação, se faz favor"), Di Stéfano (o presidente honorário do Real Madrid tem mais do que fazer do que dar entrevistas, a não ser que seja um evento-homenagem), Maradona (alguém tem aí o telefone do Fidel?), Puskas (só está entre nós no pensamento), Platini (é o presidente da UEFA e "três occupé") e Garrincha (é de outro mundo, e se não fosse fintava os jornalistas cá com uma pinta...). O que nos deixa no nono classificado do top da FIFA: Eusébio. Que atende o telefone na boa, como se fosse o Manel ou o Jaquim.

Aqui está o ponto de partida para a expressão "Eusébio é um prato": o assessor de Eusébio é o próprio Eusébio da Silva Ferreira. Atende o telefone, ouve e diz de sua justiça. O i quer entrevistá-lo na segunda-feira à noite, dia 13. Resposta dele: "Não, não pode ser. Daqui a 15 minutos, começa o Manchester United-Arsenal. Tenho de ver esse jogo. Liga-me amanhã." Muito bem, que seja na terça-feira, 14. "Hoje? Não, não dá. Então agora vou almoçar e depois tenho de ver [por momentos, ainda temi o pior e que fosse o Motherwell-Hearts, da Escócia] a meia-final do Mundial de clubes [Mazembe-Internacional]. A ver se amanhã nos entendemos, ok?" Okay, Eusébio. "Quando? Hoje? Ehhh, desculpa lá, mas não vai dar. Tenho de ver Rapid Viena-FC Porto [Liga Europa]." Mas desta vez lançamos um contra-ataque, que julgávamos ser venenoso. Qual quê! "Amanhã, quinta-feira? [a falar baixinho mas a pensar alto] às 18h, é o Levski-Sporting [com voz normal] O Sporting joga e tenho de ver. Isto está engatado. Amanhã ou depois, passa pela Tia Matilde à hora de almoço e estou lá, de certeza." Dito. E feito. É sábado, dia do Benfica-Rio Ave, e Eusébio lá está, como prometido, no balcão da Tia Matilde. Quando nos vê, não se deixa surpreender (pudera!) e diz com um sorriso: "Estava difícil, hein! Mas como vês, deu tudo certo."

O i senta-se ao lado dele. Eusébio está sentado, à espera do almoço. É cumprimentado por todos aqueles que lhe passam ao lado. Há quem o chame Eusébio ou king. Dá para tudo. Eusébio, como um rei, estica sempre o polegar em sinal de ok. Nós bem dizíamos, é um prato. E, durante uma hora, a conversa é deliciosa. Eusébio fala com calma. Avança como se fosse um extremo, às vezes recua, que é como quem diz rectifica, depois avança novamente e fala sem parar, ziguezagueando pelo vocabulário à procura da melhor palavra para qualificar este ou aquele ou para definir um ou outro momento, seja glorioso ou simplesmente anedótico. Eusébio é um prato. Já tínhamos dito? A sua memória tem não sei quantos megas de ram. Aí está outro dado que o enobrece: fala do que sabe, com pormenores incríveis. Com ele, não há cá reticências. Quando o seu almoço chega ao balcão, serve-se e tapa o copo de água com um guardanapo. Vai começar a falar... mas o seu raciocínio é interrompido pelo toque do telemóvel. É o Luís Piçarra. O toque do telemóvel, claro. "Sou do Benfica/E isso me envaidece/Tenho a genica/Que a qualquer engrandece/Sou de um clube lutador/Que na luta com fervor/Nunca encontrou rival/Neste nosso Portugal". Eusébio olha para o monitor, atende, fala de mansinho e adia a conversa para outra altura. Agora, é a hora do i. Finalmente.

Isso é o "Ser Benfiquista"...

Sim. Do Luís Piçarra! Nem imaginas o frisson que a música causava a nós, jogadores, antes dos jogos. Estávamos ali perfilados, com o adversário e os árbitros, de repente os altifalantes davam a música, nós ficávamos em pele de galinha e era como que entrássemos em campo já a ganhar. Fosse quem fosse. O Sporting ou o Real Madrid.

Pois, é curioso que fala nisso, porque vai ao encontro de uma das minhas perguntas: como é possível o Eusébio ter estado 15 anos no Benfica e só ter perdido seis jogos em 275 no Estádio da Luz? E como é que o Eusébio marcou em quatro dessas derrotas?

A sério? Seis? E já foram muitas [e ri-se com vontade]. Com quem foram?

Santos de Pelé (2-5) e FC Porto (1-2) em 1962, Sporting (0-2) em 1963, outra vez Sporting (2-4) em 1965, Manchester United (1-5) em 1966 e Ajax (1-3) em 1969.

[Eusébio olha para o ar e começa a falar só para si, mas alto] Desses seis, só dois foram para o campeonato nacional [FC Porto e Sporting-65]. O Santos, para a Taça Intercontinental. Manchester United e Ajax, para a Taça dos Campeões. E esse 2-0 com o Sporting para a Taça de Portugal. Ganhámos lá, em Alvalade, por 1-0, golo do Águas. Depois, perdemos 2-0. Dois do Figueiredo. Olha, foi essa vitória que nos tirou da final da Taça de Portugal mas permitiu ao Sporting ganhar 4-0 ao V. Guimarães e garantir o lugar na Taça das Taças, que haveria de levantar na época seguinte. Nada mal, ajudámos o Sporting, não foi?! [e ri-se mais ainda, entre dois toques do Luís Piçarra].

Porque é que disse "fosse quem fosse: o Sporting ou o Real Madrid"?

O Sporting, porque representei-os em Lourenço Marques, agora Maputo, e porque sempre foi o grande rival do Benfica. Nas 15 épocas de Benfica, fomos campeões nacionais 11 vezes e eles quatro. O FC Porto nunca foi campeão português no meu tempo. E também raramente me ganhou. Na Luz, já vimos, só uma vez. E lembro-me de uma outra vez, bem mais pesada: 4-0 nas Antas. Quatro golos do Lemos. Lembro-me perfeitamente do Rui, que era o guarda-redes do Porto, a dizer-me isso: ''Este ano é nosso'' [esse 4-0 foi em Janeiro de 1971 e estávamos na 18.ª jornada, pelo que faltavam oito para acabar o campeonato, aí liderado por Sporting, com três pontos de avanço sobre V. Setúbal, Benfica e FC Porto]. Eu disse-lhe: ''cuidado com isso, Rui. Ainda vamos ser nós os campeões.'' E fomos mesmo campeões [com três pontos de avanço sobre o Sporting, quatro sobre o FC Porto e sete sobre o V. Setúbal]. No dia em que nos sagrámos campeões, na última jornada, 5-1 à Académica [e faz o gesto de cinco com a mão direita, depois de pousar o garfo no prato], o Rui ligou-me para casa, porque naquela altura não havia nada de telemóveis: ''Tinhas razão. Vocês foram mesmo os campeões. Parabéns.'' Foi um gesto bonito, o dele.

E o Real Madrid?

O quê?

E o Real Madrid? Disse "fosse quem fosse...

Ah, está bem. Desde que me lembro da minha existência [Eusébio nasceu em Janeiro de 1942], o Real Madrid sempre foi a equipa. A máquina. E o Di Stéfano o meu grande ídolo. Eu estava em África e ouvia falar muito do Di Stéfano, do senhor que ele era, do futebol que ele jogava. Não o via a jogar, claro, mas os jornais que chegavam a Lourenço Marques, com dois ou três dias de atraso em relação à data da edição, noticiavam as façanhas do Real Madrid, a equipa que dominava o panorama europeu, como se viu com a conquista das cinco Taças dos Campeões seguidas [entre 1956 e 1960]. E o Di Stéfano era o meu ídolo.

E calhou logo encontrá-lo na sua primeira final europeia, em 1962!

Pois foi. Ganhámos 5-3, a perder 3-2 ao intervalo com três golos do Puskas. Na segunda parte, demos a volta e marquei dois golos, um deles de penálti. Antes do jogo, eu disse ao Coluna para pedir autorização ao Di Stéfano que me desse a sua camisola número 9 no final. Jogámos, ganhámos e, quando o árbitro apitou para o fim, lembrei ao Coluna o pedido da camisola. Lá fomos e o Di Stéfano, cabisbaixo mas afável, deu-me a camisola. Vê lá, tinha acabado de me sagrar campeão europeu e só queria a camisola do Di Stéfano. Está guardada, e é uma relíquia.

Já naquele tempo era costume trocar de camisola?

Não muito, mas eu era novo e o Di Stéfano era uma referência. Ainda hoje é! Aquele era o momento.

Trocou com mais quem?

Tanta gente. Hilário, do Sporting.

E voltámos ao Sporting. Por muitos defesas que o tenham marcado, foi um guarda-redes que ficou célebre por sua causa: o Damas!

Grande amigo. Havia uma rivalidade dentro de campo pelas equipas que representávamos mas a nossa amizade era superior a tudo isso. Quando nos encontrávamos por acaso em Lisboa, íamos almoçar ou jantar ou as duas coisas com as nossas famílias. Juntos, vivemos grandes tardes. Na Luz, em Alvalade, no Jamor. Grande homem, grande guarda-redes.

O Damas também ficou conhecido como o Eusébio do Sporting. Aliás, imagine Portugal sem Eusébio. Não havia estátua Eusébio no Estádio da Luz, não havia Damas como Eusébio do Sporting, não havia jogador português no top 10 dos melhores de sempre do século XX, provavelmente o Sporting tinha ganho mais campeonatos, o Benfica menos... Pergunta: se o Eusébio não tivesse vindo para Portugal, o que estava agora a fazer?

A jogar futebol. Acredita em mim. O meu futuro seria sempre futebolista. Há até uma história curiosa. A minha mãe nunca me quis deixar ir embora de Lourenço Marques. Aos 15 anos, a Juventus, a Juventus de Itália, ok?, queria contratar-me, porque um olheiro deles, que tinha sido um conhecido guarda-redes italiano da Juventus, viu-me e disse-lhes que havia ali um rapaz com potencial, que seria bom aproveitar enquanto eu estivesse incógnito. A Juventus chegou-se à frente mas a minha mãe não quis ouvir nada nem ninguém.

Como eram esses tempos em Lourenço Marques?

Grandiosos. Lembro-me dos jogos que fazíamos. Lembro-me de procurar meias, enrolá-las todas, misturá-las com papel de jornal e daí fazer uma bola. E lembro-me também dos nossos concursos. Quem ganhasse, comia dez castanhas!

Como é que era isso?

Eram concursos de habilidade. Tínhamos de fazer corridas com distâncias pré-definidas a dar toques naquelas bolas [e começa a explicar por gestos, com as duas mãos]. Primeira prova: 20 metros. O primeiro a dar chegar à linha da meta sem deixar a bola e trocá-la do pé direito para o esquerdo o maior número de vezes possível qualificava-se para a fase seguinte, que era a prova dos 50 metros, daí para os 100 e acabávamos nos 200 metros. Sempre na mesma coisa: pé direito, pé esquerdo, pá, pá, pá, pá [as mãos a bater uma na outra fazem eco na Tia Matilde] até cortar a meta. Aquilo eram tardes a fio, dias seguidos, meses, anos... O vencedor ganhava castanhas que assávamos ali na hora, mas nunca, nem por uma vez, o vencedor ficou com todas as castanhas. Qualquer que fosse o vencedor, dividia-as com todos os outros. Ehhh, grandes tempos [olha em frente, para uma parede vazia de conteúdo, mas os olhos transmitem emoção]. Cá em Portugal, o meu treino era outro, claro.

Então?

No final de cada treino, eu ficava no campo a treinar remates. Punha dez bolas ao longo da grande área e ia rematando à baliza. Pá, pá, pá [a Tia Matilde não estremece com o eco, mas pouco falta], pé direito, pé esquerdo, ao ângulo superior, rasteiro ao poste mais distante. Fazia este exercício dez vezes por dia, o que dava cem remates no total. Dez à vez, depois ia buscar as bolas, porque não havia cá apanha-bolas nem nada, não é? Distribuía as bolas outra vez pela área e pá, pá, pá, pá.

Um dia destes, vi uma fotografia sua à baliza. O Eusébio tinha estilo, hããã!

[sem mexer as pernas nem os pés, move o tronco para direita e para a esquerda] O treino de guarda-redes era o melhor para os rins, para os abdominais. Para ficar definitivamente em forma, ia à baliza na parte final dos treinos e dizia ao Simões para me atirar bolas para o lado esquerdo e para o lado direito. Com a mão, mas também em jogadas de um para um. E eu atirava-me aos pés dele.

Podia então ter defendido a baliza do Benfica naquela final da Taça dos Campeões com o Inter, em Milão, quando o Costa Pereira se lesionou?

Sim, podia.

Bem... se fosse, a sua lenda era maior ainda: ir à baliza numa final da Taça dos Campeões. E se não sofresse nenhum golo, como aconteceu com o Germano? Aí então...

Nessa final com o Inter, havia três hipóteses: eu, o Cavém e o Germano. Como estávamos a perder e precisávamos de dar a volta, eu fiquei na frente e lá foi o Germano para a baliza, que manteve o 1-0. Ele já estava a coxear e sem hipótese de acompanhar o arranque de algum adversário.

Sabe qual foi o guarda-redes a quem marcou mais golos?

Não.

Ao Américo, do FC Porto.

Quantos?

17.

Estivemos juntos no Mundial-66. Belo guarda-redes. Porto e Sporting sempre estiveram bem representados na baliza.

Tirando o Damas, quem se destacava mais? Carvalho, Octávio de Sá, Carlos Gomes...

O Carlos Gomes [e olha para a frente, como se o estivesse a ver naquele preciso momento]. Uma vez, quando ele defendia o Atlético, treinado pelo José Águas [1961-62], o intervalo de um jogo com o Benfica demorou mais tempo que o habitual. A PIDE estava na Tapadinha e ia levá-lo para interrogatório. Mas só depois do jogo. Ao intervalo, um amigo dele, que também era meu, alertou-o para isso, meteu-o na bagageira de um boca de sapo [Citröen] e lá foram para Badajoz. O Carlos Gomes foi parar a Marrocos, a jogar no Tânger. E o intervalo desse jogo demorou sei lá o quê. Quando o Atlético entrou em campo, o Carlos Gomes já estava a caminho de Badajoz. Sabes porque é que o Carlos Gomes está aqui? [e aponta para a cabeça]

Não faço ideia. Sei que ele sempre foi irreverente e que jogava de preto, em protesto com o amadorismo do futebol e dos seus dirigentes.

Não [e esboça um sorriso largo]. Lembro-me dele era eu um miúdo de oito anos e ia ver com o meu tio os particulares das equipas portuguesas em Lourenço Marques. Era um costume, e antes dessa equipas regressarem a Portugal, ainda iam à África do Sul para ganhar mais um cachet. Lá, os negros não podiam jogar. Lembro-me que o Sporting jogou em Lourenço Marques com o Jorge Mendonça e na África do Sul não o pôde fazer. Eles tinham um campeonato para brancos e outro para negros. Mas porquê? Se somos todos iguais: brancos, pretos, amarelos, azuis... Na África do Sul, era assim. E lembro-me que o Atlético Clube de Portugal [faz questão de repetir o nome do clube] chegou à África do Sul e voltou logo para Portugal, porque recusou as imposições dos sul-africanos, de jogar sem o Ben David, que era cá um jogador [quatro golos em seis internacionalizações por Portugal, entre 1950 e 1952]. Mas volto ao Carlos Gomes.

Ok. Carlos Gomes, então

Num jogo desses, ele foi expulso de campo. E eu lembro-me, tão bem, mas tão bem, da malandrice dele. [Eusébio faz o gesto do árbitro "para a rua", porque ainda não havia cartões, e traça uma grande área imaginária com talheres, pratos e copos, sem tirar o guardanapo de cima daquele que tem água] Ele foi da baliza até à bandeirola de canto e daí até ao meio-campo sempre pela linha, sem nunca sair do campo. Estavam todos a olhar para ele, a ver quando saía para recomeçar o jogo. Quando ele chegou ao meio-campo, desapareceu rumo ao balneário. Quando cheguei a Portugal, vi-o e disse para mim ''olha quem é ele''.

Quando chegou a Portugal... Ainda se lembra do primeiro jogo que viu do Benfica?

Claro. Cheguei numa quinta-feira [15 de Dezembro], depois da mais longa viagem de sempre. Acho que foram 30 ou 31 horas de avião. Tantas escalas... Só me lembro de uma: Dacar [Senegal].

E depois?

Bem, cheguei a Lisboa à noite e do aeroporto fui para o Lar do Jogador, onde conheci todos os jogadores e mais o treinador, o Bela Guttmann. Sabes que ele nunca me tratou por Eusébio? Nunca! Era sempre o menino. O menino tem de ir connosco, o menino tem de fazer isto, o menino tem aquilo... Do Lar do Jogador, viajei para a Covilhã. Apanhei o comboio aqui [e aponta lá para fora, para a Estação do Rego]. Fazia cá um frio lá em cima. Quis ir-me embora. De lá, da Covilhã, e até de Portugal. Foi o Coluna que me sossegou. Eu conhecia-o de Lourenço Marques e as nossas famílias davam-se bem. Eu até tratava a mãe dele por tia. E o meu irmão deu-me uma carta para lhe entregar no dia em que o visse em Lisboa. Nesse jogo na Covilhã, começámos a perder mas ganhámos 3-1.

Chegou em Dezembro de 1960 mas só se estreou em Junho de 1961.

Sim, houve muita burocracia pelo meio, entre Sporting, Benfica, federação... Em Junho, lá me estreei. A 1 de Junho, no dia seguinte ao Benfica ter ganho a primeira Taça dos Campeões [3-2 ao Barcelona, em Berna]. A Federação Portuguesa não quis adiar o jogo e o Benfica apresentou a equipa B. Perdemos 4-1, nos Arcos.

Mas o Eusébio marcou um golo [o 473.º e último golo oficial de Eusébio pelo Benfica, em Março de 1975, também foi com o V. Setúbal, mas já no Bonfim]

Sim, o 3-1.

E também falhou um penálti?

È verdade, defendido pelo Félix. O pai do Mourinho.

Falhou mais penáltis?

Um para o Maló, da Académica [na Luz, em Outubro de 1966: 2-1 para o Benfica]. E outro para o União de Almeirim.

Como é que é?

Para a Taça de Portugal, com o União de Almeirim [32 avos-de-final, a 9 de Fevereiro de 1969]. Ganhámos 8-0, eu já tinha marcado três ou quatro, não me lembro bem [foram três, e vale a pena dizer que Eusébio marcou 18 em nove jogos nessa edição da Taça, que o Benfica levantou, numa final com a Académica, que meteu prolongamento e só se evitou um segundo jogo por-culpa-vocês-sabem-de-quem]. E houve um penálti. Eu fui batê-lo e o guarda-redes disse-me que o pai dele estava no Estádio da Luz. Eu então disse-lhe que ia atirar para aquele lado [Eusébio aponta o seu lado direito] e ele foi lá buscá-la. Eu e ele tirámos fotografias, com o pai também, e, durante essa semana, ele virou herói nacional, com reportagens numa série de jornais. Foi engraçado [e sorri largamente, como se lhe estivessem a dar uma Bola de Ouro].

Seis derrotas na Luz, 11 títulos de campeão nacional em 15 épocas, três penáltis falhados, duas Botas de Ouro [melhor marcador europeu] e uma Bola de Ouro [melhor jogador da Europa para a France Football]. Que carreira. Falta-lhe alguma coisa?

Já que fala nisso... Podia ter ganho duas Bolas de Ouro.

Pois. Ganhou uma em 1965, com oito pontos de vantagem sobre Facchetti, lateral italiano do Inter. Mas perdeu a de 1966, para Bobby Charlton. Por um ponto, não foi?

Sim. Um ponto.

E o voto foi de um jornalista português, o Couto e Santos, do Mundo Desportivo. Ele votou no Bobby Charlton em primeiro lugar, eu em segundo [em 1966, Charlton foi campeão do mundo e eleito o melhor jogador pela FIFA numa prova em que Eusébio foi melhor marcador destacado, com nove golos em seis jogos]. O Charlton acabou com 81 pontos, eu com 80. Se ele votasse em mim, seria o contrário: eu 81, o Charlton 80.

E alguma vez falou com Couto e Santos sobre isso?

Siiim. Ele sempre me disse que votou no Charlton porque julgava que eu ia ganhar com avanço. Como é que alguém pode pensar isso numa votação secreta? E o que é que eu podia fazer-lhe? Nada, não é? Apenas perguntei-lhe e ele respondeu-me desta forma. Se ele votasse, eu seria o primeiro jogador a ganhar a Bola de Ouro duas vezes seguidas.

A Bola de Ouro perdida para o Bobby Charlton. Mais alguma coisa que lhe falta? Li algures que nunca jogou com o Matateu.

É verdade, o Matateu. Ele nunca jogou comig... Desculpa, eu nunca joguei com o Matateu. Assim é que é, assim é que se deve dizer: eu nunca joguei com ele. Só uns treinos na selecção portuguesa, com o Peyroteo a treinador. [E o Luís Piçarra entra novamente pelos nossos ouvidos dentro... Eusébio é ou não é um prato?]"

Por Rui Tovar, in I

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Feliz Natal


O Gloriosa Chama Imensa deseja a todos os seus leitores um Feliz Natal, carregado de esperança e entusiasmo para o futuro que se adivinha (como sempre) glorioso.

Feliz Natal a todos!

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

JVP


Benfica-Rio Ave

1 - O Benfica da época passada nos primeiros 35 minutos…

A primeira parte dividiu-se em duas e nos primeiros 35 minutos esteve em campo um Benfica muito forte, a exercer muita pressão sobre a bola, com mais iniciativa, maior dinâmica, velocidade e criatividade no seu futebol. Foi um Benfica muito próximo daquele que vimos na temporada passada. E muito eficaz também, pois aos oito minutos já vencia por 2-0. Dava a sensação de que seria um jogo semelhante a muitos que vimos na última época. A verdade é que, ao não ter feito o 3-0, o que mataria o jogo, acabou por desacelerar e consentiu maior estabilidade e serenidade ao Rio Ave, que passou a aproximar-se mais da área benfiquista.

2 - … E uma excelente reacção do Rio Ave

Após esses primeiros 35 minutos de desconcentração e surpreendido pela entrada forte do Benfica, com o bloco muito baixo e intranquilidade com a bola, o Rio Ave conseguiu reagir, mostrou boa atitude e proporcionou um bom espectáculo. O que certamente não estaria nas previsões de muita gente, pois não é nada fácil estar a perder por 2-0 logo aos oito minutos em casa de um grande e, ainda assim, conseguir reagir! A partir daí, a equipa de Vila do Conde esteve bem melhor do que mostraram os primeiros oito minutos, até porque não é daquelas que põem o autocarro à frente da baliza mas jogam o jogo pelo jogo. Ao reduzir para 2-1, o Rio Ave colocou incerteza no resultado, pois estava gradualmente a melhorar e isso deu-lhe alguma esperança, o que justificou a sua entrada na segunda parte: mais atrevido, mais subido no terreno e à procura da sua sorte. Isso, no entanto, proporcionou o terceiro golo do Benfica.

3 - Dois momentos decisivos

O terceiro golo do Benfica, aos 52 minutos, e a oportunidade falhada por João Tomás, oito minutos depois, são os momentos que definem este jogo. Por um lado o Benfica voltou a sentir maior segurança, por outro o Rio Ave perdeu a oportunidade de fazer o 3-2 e de devolver a intranquilidade ao Benfica e a incerteza até final. Acabou por não ser assim e o 4-1 matou o jogo, apesar de o Rio Ave nunca ter desistido e de ter dado uma boa resposta, sobretudo porque conseguia colocar muitos homens na frente. A vitória do Benfica é indiscutível mas o Rio Ave merecia mais um golo para valorizar a sua atitude no jogo.

4 - Rio Ave expôs intranquilidade defensiva do Benfica

Duas razões explicam a intranquilidade defensiva do Benfica, que foi posta a nu pelo Rio Ave. Primeiro, a ausência de Luisão, que comanda a defesa e faz com que os jogadores ao lado e à sua frente sejam mais agressivos e concedam pouco espaço aos adversários. A sua voz é importante. Depois, um certo entusiasmo atacante provocou desequilíbrios defensivos que chegaram a originar situações de igualdade numérica entre defesas do Benfica e atacantes do Rio Ave.

5 - Salvio o melhor em campo

O melhor em campo foi Salvio e, de acordo com o que disse Jorge Jesus, com alguma sorte pois foi titular devido a uma indisposição de Carlos Martins. Velocidade, bons movimentos e eficácia foram os seus principais predicados neste encontro, em que mostrou pormenores de qualidade. Este jogo certamente moralizou-o e pode ter sido importante, na medida em que terá dissipado dúvidas que começavam a surgir, eventualmente até no treinador.

6 - Estranhei o segundo amarelo de Coentrão

Coentrão era um dos jogadores do Benfica em risco de suspensão caso visse mais um cartão amarelo, daí não haver nada a fazer depois de ter visto o primeiro. Confesso que estranhei o segundo e não percebi se foi precipitado, ingenuidade ou se houve alguma estratégia… É uma peça importante e embora o Benfica tenha alternativas, nenhuma terá o mesmo valor do internacional português.

7- Segurança de Roberto

Roberto foi chamado a intervir várias vezes e fê-lo sempre bem. É um guarda-redes atento, eficaz e demonstrou segurança, como que querendo provar que a má fase já está ultrapassada.

8 - Pressão para o FC Porto

A vitória do Benfica coloca sempre alguma pressão no FC Porto, a começar porque neste momento está a cinco pontos. A experiência diz-me que isto não passa ao lado dos jogadores e lembro-me do último título que ganhei no Sporting, que foi discutido com o Boavista durante dez ou 11 jornadas, a um ou dois pontos de distância. Além disto, o FC Porto tem uma deslocação complicada. O Paços de Ferreira é uma equipa difícil em casa, conhece bem o seu espaço e joga bom futebol. Em casa, dificulta sempre a tarefa aos grandes.

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Benfica 5 - 2 Rio Ave - 14ª Jornada 2010/11

De volta ao campeonato, depois de uma dupla jornada agridoce (à terrível exibição para a Liga dos Campeões, com o Schalke 04, seguiu-se uma saborosa vitória sobre o Braga para a Taça), o Benfica conseguiu uma exibição muito mais agradável que a realizada no último jogo em casa, com o Olhanense. Principalmente em termos atacantes. A entrada a matar chegou a fazer lembrar a temporada passada, em que os primeiros 10 minutos em casa eram, por norma, fatais para os adversários. No entanto, os muitos erros da defesa fizeram com que a incerteza no resultado se mantivesse mais tempo do que o previsto.


O Benfica entrou no jogo praticamente a ganhar. Numa das suas já habituais subidas, o neste jogo capitão David Luiz descobriu Aimar que, na cara de Paulo Santos, não falhou. Começava aqui a sucessão de acontecimentos inesperados neste encontro.
Apenas 3 minutos depois (aos 8), Saviola respondeu da melhor forma a um bom cruzamento de Gaitán (uma das mais-valias do argentino contratado este ano ao Boca Juniors) e, embora contando com a ajuda de um jogador do Rio Ave, voltou a marcar - depois de um começo atípico, em que parecia divorciado das balizas adversárias, começa a tomar-lhe outra vez o gosto.


O Benfica continuou em cima do Rio Ave, a pressionar, tentando acabar com o jogo o mais depressa possível (destaque para um falhanço incrível de Cardozo aos 25 minutos, só com o guardião adversário pela frente). Como quem não marca sofre, o Rio Ave acabaria por reduzir a desvantagem em cima do intervalo, num contra-ataque superiormente conduzido por Mendes e finalizado por (quem mais podia ser?) João Tomás. Aos 35 anos, o avançado nascido em Oliveira do Bairro continua a dar cartas - é, para mim, o melhor ponta-de-lança português desde há vários anos a esta parte. Mas isso digo eu, que não percebo nada disto. E é o melhor jogador deste Rio Ave, isso sem margem para dúvidas.


Qualquer ideia de resposta dos vila-condenses, todavia, esfumou-se logo a abrir a segunda parte, num lance em tudo semelhante. Salvio teve uma arrancada fulgurante pela direita e assistiu Saviola para o bis. E aqui tenho de fazer um mea culpa: na crónica do jogo com o Olhanense, fui retumbante em considerá-lo um barrete. Para mim, era o único adjectivo que lhe podia apontar até agora, pois ainda não o havia visto a fazer uma boa exibição. Neste jogo, contudo, Salvio este irrepreensível, não só pelos golos que marcou (já lá vamos) mas principalmente pelas oportunidades que criou e pela forma como dinamizou o ataque encarnado. Espero que o nível exibicional se mantenha.
Aos 62, o argentino emprestado pelo Atlético de Madrid estreou-se a marcar pelo Benfica, apontando um golo que já vinha a merecer pela grande exibição que estava a realizar (isto, 6 minutos depois de Roberto ter feito mais uma grande defesa, à queima num remate de João Tomás). Saliente-se ainda mais um excelente trabalho e cruzamento de Gaitán na esquerda.


O Rio Ave ainda faria o 4-2, num penalty de João Tomás, e Salvio teria mais 2 grandes momentos: o 5-2, num golo de cabeça de fora da área (algo poucas vezes visto nos relvados) e um remate à barra aos 86 minutos que lhe teria dado o merecido hat-trick. Não aconteceu, mas não foi isso que deslustrou de modo nenhum a exibição do internacional sub-21 argentino.

O triunfo permitiu-nos manter as distâncias para os mais directos perseguidores. O Porto voltou a vencer (com mais uma ajuda dos homens do apito... impressionante!), o que significa que chegamos ao Natal a 8 pontos do 1º lugar. O título será muito complicado, todos temos essa noção, mas o 2º lugar é perfeitamente alcançável (neste caso, basta mantê-lo). Agora os jogadores irão de férias (a maioria já foi) e esperemos que cheguem com as energias renovadas para atacar todas as frentes em que o clube ainda se move: temos 2 taças para vencer e uma onde fazer boa figura é imperioso. Honremos o nome deste clube.

O resumo do jogo:



PS: A equipa de basquetebol conseguiu um apuramento histórico para a próxima fase da EuroChallenge, em que estarão presentes apenas 16 equipas. Apesar da derrota na Estónia, os encarnados beneficiaram do triunfo dos búlgaros do LukOil Academic (que só perdeu na Luz em toda a fase de grupos) para passar à fase seguinte. Parabéns a toda a secção, e que continuem a elevar bem alto o nome do Benfica na Europa do basquetebol!

sábado, 18 de dezembro de 2010

O Benfica no campeonato - Benfica 2 - 1 Rio Ave 2009/10

Aqui não havia nada que inventar. Apesar de já nos termos encontrado muitas vezes com o Rio Ave na nossa história, creio que o jogo mais importante foi mesmo o da última jornada da época passada, em que um triunfo nos daria o título. Felizmente aconteceu e pudemos festejar o 32º campeonato do nosso historial. Espero que o encontro de hoje tenha o mesmo fim (os 3 pontos).

Estávamos então na última jornada e bastava-nos vencer em casa o Rio Ave para assegurar o título (na verdade, com o empate do Braga na Choupana até podíamos ter empatado também). O jogo começou-nos de feição, com Cardozo a marcar logo aos 3 minutos, num golo que o colocava a par de Falcao na frente dos melhores marcadores, com 25 golos. O Benfica acabou por adormecer depois, limitando-se a controlar o jogo, e um balde de água fria caiu sobre a cabeça de todos nós quando, aos 72 minutos, o Rio Ave empatou na única vez que chegou à nossa baliza, por Ricardo Chaves. A resposta acabaria por não se fazer esperar: 7 minutos depois, Cardozo resolveu o encontro, sagrando-se ainda o melhor marcador do campeonato. Nesse 11 estavam presentes, do actual plantel, Rúben Amorim, Luisão, David Luiz, César Peixoto, Airton, Carlos Martins, Aimar, Saviola e Cardozo (entrariam depois Maxi Pereira e Nuno Gomes). No banco, não utilizados, ficaram Moreira, Sidnei, Felipe Menezes e Kardec. Júlio César, Roderick, Luís Filipe, Weldon e Mantorras não foram convocados por opção, enquanto Fábio Coentrão e Javi García estavam castigados. Que a vitória se repita hoje (se possível com menos aflição).

O resumo desse jogo, aqui:

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Sorteios

Há dias saiu o sorteio referente aos quartos-de-final da Taça de Portugal. Ao Benfica calhou jogar com o Rio Ave em Vila do Conde, caso consigamos ultrapassar, em casa, o Olhanense no jogo em atraso dos oitavos. Não sendo o sorteio mais amigo possível (esse calhou ao mesmo de sempre), não deixa de ser verdade que está totalmente ao alcance do Benfica. A nossa obrigação é agora chegar pelo menos às meias-finais da prova, onde sabemos que vamos ter pela frente o Porto e talvez o Vitória de Guimarães e a Académica, salvo alguma surpresa de última hora. O curioso é verificar que o Porto continua, eliminatória após eliminatória, ano após ano, a ser bafejado pela "sorte". Vejamos o percurso dos portistas até à meia-final deste ano: Limianos em casa, Moreirense fora, Juventude de Évora em casa e Pinhalnovense em casa. Até às meias-finais, nem um adversário da I Liga. E já nas outras épocas se tem verificado a mesma coisa. Não será sorte a mais? Começo verdadeiramente a acreditar na teoria das bolas quentes e frias. Já andei mais longe... Bem, mas o que nos interessa é a nossa casa, é o que acontece ao Benfica, e a verdade é que temos a obrigação de estar nas meias-finais. O resto não interessa.

Quanto ao sorteio da Liga Europa, conhecido hoje, a verdade é que também não o considero o pior possível. Dentro dos clubes que nos podiam ter calhado em sorte, tocou-nos o penúltimo classificado do campeonato alemão, que tem feito uma temporada interna miserável mas que na Europa está a reinar (onde é que eu já vi este filme?). O certo é que será um adversário realmente difícil de ultrapassar para o Benfica, que irá ter de dar o máximo se quer fazer boa figura nesta competição. Nunca vencemos na Alemanha (o estigma mantém-se, ano após ano), pelo que espero que seja agora. Se não der para ganhar lá, ao menos que se empate e ganhe em casa. Sendo difícil, há possibilidades de seguirmos em frente. O resto são peanuts.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

JVP


Benfica-Braga

1 - Eram dois a querer ganhar e houve justiça

Vitória difícil, mas justa do Benfica, a equipa que mais oportunidades criou contra um Braga muito competitivo, mas pouco objectivo no último terço do campo. Num confronto em que as equipas acusaram visivelmente a pressão que nesta altura se abate sobre ambas, embora seja muito mais forte aquela que é exercida sobre o Benfica e o seu treinador, o jogo teve alguns pontos de interesse, a começar pelas cautelas postas em campo pelos dois conjuntos até às variações tácticas da segunda parte. Porque mesmo que o Braga possa lamentar a ausência de jogadores tão importantes na equipa como Moisés, Vandinho e Matheus, mostrou claramente que entrou na Luz com uma estratégia para tentar ganhar. E é sempre bom que haja duas equipas a querer mesmo ganhar um jogo.


2 - Braga tinha uma boa ideia, mas não conseguiu pô-la em prática

Ao contrário do que é costume, mas também por efeito da pressão exercida pelo Benfica, a equipa visitante errou muitos passes, o que lhe dificultou a circulação de bola, obrigando-a a jogar um futebol mais directo do que lhe é habitual, procurando fazer com que Meyong, Paulo César ou Alan aparecessem libertos nas costas da defesa benfiquista. Do meu ponto de vista, essa era uma boa estratégia, uma das armas a utilizar pelo Braga. Por aquilo que o jogo estava a dar - sempre muito cauteloso de ambos os lados -, o Braga não era capaz de fazer uma boa circulação de bola e, como os centrais do Benfica não são muito rápidos e já os temos visto em dificuldades em lances em que a bola lhes é metida para as costas, a ideia do futebol directo era boa, mas a equipa não conseguia boa definição no último passe, pelo que, em todo o jogo, só conseguiu criar uma oportunidade de golo, na sequência de um canto, já no final do encontro, na qual Júlio César fez uma defesa extraordinária. Ou seja, ao Braga faltou objectividade e eficácia.

3 - Benfica mais forte, só que o golo é um contra-senso

No meio de tanto rigor táctico, pois as equipas apostaram nisso, nos minutos iniciais percebeu-se que ambas tinham montadas estratégias para ganhar, mas com o passar do tempo o Benfica foi provando que estava melhor e mais perigoso, assumindo a iniciativa, criando alguns lances de perigo. Mas acabou por inaugurar o marcador num lance que foi um contra-senso; com tanta preocupação táctica, sofrer um golo num lançamento de linha lateral não lembra a ninguém. Javi García ganhou a primeira bola rodeado por três jogadores do Braga. Depois, sim, houve mérito de Saviola, que adivinhou o lance e se antecipou a Sílvio, mas aquela bola não podia ter passado.

4 - Domingos arrisca tudo

A segunda parte foi muito diferente em termos estratégicos. O Braga subiu no terreno, tentou pressionar mais alto e jogou muito mais tempo no meio campo do Benfica - também porque a equipa da casa baixou as linhas propositadamente e deu a iniciativa e algum espaço para depois explorar as transições rápidas, como gosta de fazer, tendo conseguido algumas bem perigosas. Mesmo com maior iniciativa do Braga, por falta de soluções dos visitantes, era o Benfica a criar os lances de maior perigo. É importante acrescentar que a inoperância bracarense no último terço do terreno se devia também à concentração defensiva dos benfiquistas.
Com meia hora para jogar, Domingos arriscou tudo metendo Hélder Barbosa e Keita. Fez o que tinha a fazer - Hélder Barbosa é um jogador irreverente que gosta de ter a bola no pé e não se impressiona com ambientes desfavoráveis -, mas o Benfica estava muito cómodo com a sua nova maneira de jogar e acabou por marcar o segundo mesmo a acabar.
Uma palavra de apreço para o jovem Guilherme, que joga no satélite Vizela. Não é fácil, aos 19 anos, estrear-se a jogar no Estádio da Luz, ainda por cima numa posição que não é a dele de raiz.

5 - Pressão para dois

Este era um jogo que valia bem mais que uma simples eliminatória de Taça, pois desde o sorteio que se sabia que um de dois possíveis candidatos a ganhar a prova ficaria pelo caminho. Desde que o sorteio os juntou, aconteceram muitas coisas de ambos os lados. A pressão sentia-se antes do jogo, até nas declarações dos treinadores, ambos muito cautelosos, tal como depois a montar as respectivas equipas. O Benfica saiu de um péssimo resultado na Liga dos Campeões e, por cá, as coisas também não têm corrido pelo melhor. A pressão que está a ser exercida sobre o treinador também mexe com a equipa, é impossível os jogadores passarem ao lado. Cria-se grande ansiedade.
Do lado do Braga, a Liga dos Campeões tem servido para minimizar alguns resultados menos conseguidos internamente, mas uma equipa que ficou no segundo lugar na época passada criou expectativas grandes que está com dificuldades em cumprir. Para além disso, discutir uma eliminatória na Luz nunca é fácil.